sexta-feira, 16 de julho de 2010

Gustavo Ioschpe: O Palpiteiro Privatista de Plantão

Mais uma vez palpitando a respeito da educação pública em detrimento dos modelos educacionais defendidos pela Veja.

Por Viviane Bastos[1]

Não é difícil entender Gustavo Ioschpe. Ele tem uma formação acadêmica cara e privatista, com duas graduações por Wharton e mestrado por Yale. Porém entender a sua formação não significa aceitar suas falações pequenezas em matéria de educação. Se o referido se dignasse a falar de dados estatísticos da economia capitalista, ignorando as suas agonizantes crises, eu ainda suportaria. Até porque como ele existem vários outros por aí, escrevendo artigos reacionários ao seu bel prazer para as “imparciais” e “democráticas” Veja, Isto é, Folha e outras. No entanto o Senhor Ioschpe resolve dar seus “pitacos” na área das Ciências Humanas e da Educação. Nada contra economistas que especializam-se em educação e contribuam para as discussões, desde que tenham investigação prática, coerência e ética. Ioschpe porém, cisma em falar de educação e ainda mais da educação pública, sem o mínimo de respeito e cientificidade.

Ignorante em matéria de humanidades o autor escreveu para Veja uma matéria intitulada: “Aula de ética é em casa, não na escola” (28/06/2010). Vejamos: Gustavo neste artigo defende a não abordagem da ética e cidadania na escola, em detrimento dos conteúdos (pesquisa empírica, neurociência, etc.) que devem ser “ensinados”, aos alunos. Neste sentido, percebe-se que, Gustavo teve realmente em sua formação pouca noção de ética e cidadania, em que o indivíduo conhece, respeita e contribui para a melhoria das condições reais de seu país. Talvez a sua cidadania tenha se baseado na formação dos países de capitalismo desenvolvido, quais sobrevivem da expropriação que fazem das riquezas do “terceiro mundo”, portanto dignam-se a pensar de forma reducionista quando o assunto é direitos e deveres. Embora em seu artigo cite a pesquisa empírica, em sua prática ele nega esta palavra escrevendo este artigo baseado em seu achismo misturado com alguns dados destorcidos.

Ioschpe argumenta que em um país como o Brasil onde os índices de educação não são satisfatórios, deveríamos nos preocupar menos com lições de moral e mais com a defasagem de conteúdos. Ataca professores de geografia, história e língua portuguesa por apresentarem uma formação marxista. Um tremendo preconceito.

Preocupa-se com o ensino de ciências e da preservação ambiental, dizendo que não quer que seu filho aprenda isso, pois o corte de algumas árvores pode fazer com que melhorem as condições de vida de algumas pessoas sem renda.

Ora! Francamente. Acredito que por mais “ingênuos” e despolitizados que possam ser os leitores da revista, todos são capazes de compreender o que é o ensino de preservação ao meio ambiente. Até as crianças da primeira etapa do ensino fundamental, sabem o que são ações de desmatamento em grande escala e ações dos pequenos produtores rurais para a sua subsistência; Porém o célebre autor, em seu texto provavelmente não se referia aos pequenos produtores, mas sim estava preocupado com os latifundiários que destroem o meio ambiente para produzir monoculturas para exportação, melhorando assim os dados econômicos internacionais do país, gerando renda precária para os camponeses semi-escravos e grandes lucros para os fazendeiros.

Ioschpe ataca os professores chamando-os de dogmáticos, e assim, mostra o seu desrespeito pelos profissionais da educação e sua precária formação na área de educação. Desconsidera os ensinamentos básicos dos clássicos: Rosseau, Vygotsky, Freire, Gramsci, e o próprio Marx. O colunista nega a consciência coletiva, formada durante a nossa socialização, composta por tudo aquilo que habita nossas mentes e que serve para nos orientar com relação ao ser, ao sentir.

Esta idéia é a concepção geral não só de Ioschpe, mas também da revista Veja como um todo. Esta concepção se aproxima da perspectiva da pedagogia não-diretiva, ou pedagogia da neutralidade, que se volta mais para a criação de métodos do que a formação do conteúdo. Segundo Moacir Gadotti, essa pedagogia visa o desenvolvimento cognitivo dos alunos a despeito da conscientização político-social. Claramente este modelo de educação inculca valores como o individualismo nos alunos, sem que as pessoas se apercebam, privilegiando-se o esforço, o trabalho e os sucessos individuais, em detrimento do trabalho em equipe, da valorização da ajuda mútua e da solidariedade.

O autor inicia seu artigo dizendo estar preocupado, pois nas escolas ouve-se pouco falar em desenvolvimento cognitivo. Tomemos então como referência um dos teóricos mais utilizados nesta área; Jean Piaget. Para ele a própria moral pressupõe inteligência, haja vista que as relações entre moral x inteligência têm a mesma lógica atribuída às relações inteligência x linguagem. Quer dizer, a inteligência é uma condição necessária, porém não suficiente ao desenvolvimento da moral.

Sem nenhuma prática na área de educação, o autor não considera que as crianças em idade escolar estão em pleno desenvolvimento sócio-cognitivo e tem limitações ao colocarem-se no lugar de outrem, necessitando, portanto de noções e indicações de valores éticos e morais. Mesmo entendendo e concordando que a criança deve receber em casa determinados valores, não é possível ignorar que os educandos passam de 4 à 6 horas na escola e que está cumpre um grande papel nos referenciais éticos do aluno; Não podemos ignorar que muitas de nossas crianças vão nutrir-se de carinho, atenção e noções básicas de ética somente na escola. Isso para não citarmos os casos mais severos, que não são poucos, onde as crianças fazem apenas na escola a sua única alimentação, recebem noções básicas de higiene e comportamento humano. Será possível que o autor defende que as crianças da favela, recebam apenas a noção ética presente nas ruas que circundam as suas casas, onde morrem cada dia mais pessoas por balas perdidas em tiroteios dos traficantes com a polícia? Sabemos da luta das famílias honestas que residem nas periferias e que buscam da melhor forma educar seus filhos. Mas é fato, também estatístico, que nas comunidades pobres as crianças tem maior envolvimento com drogas e criminalidade.

Durante todo o artigo percebo também uma grande confusão por parte do autor com relação á avaliação. Primeiro nosso digníssimo “comentarista de educação”, cita dados do IDEB[2] comparando-o com o PISA[3]. Contudo, faz-se necessário primeiro lembrarmos como o próprio autor em seu artigo, que estes são dois sistemas diferentes de avaliação. Deixo claro que meu objetivo não é defender o IDEB e nem o PISA, porém como é a referência do autor devo citá-los.

O PISA é uma avaliação de caráter internacional. Isto implica na necessidade de levar em conta diferenças culturais, de valores e tradições nos diversos países no qual é aplicado. Ao mesmo tempo, é necessário verificar os conhecimentos que foram obtidos no currículo escolar de ciência, principalmente,para fornecer um indicador a respeito do sistema educacional do país comparativamente aos outros.

Segundo, que a avaliação depende dos objetivos a serem atingidos. Ou seja, cobramos o que queremos que o aluno domine. Pelo jeito Ioschpe defende um ensino quantitativamente técnico, pois sempre se espelha em dados e não em processos qualitativos, que em minha opinião garantiria a formação de verdadeiros cidadãos e não de hipócritas como o referido. Em terceiro lugar o autor deveria consultar qualquer livro, apostila ou artigo a respeito da Educação Comparada. Em minha formação acadêmica tínhamos uma disciplina com este nome, um de seus princípios básicos, era analisarmos a educação dentro do contexto social, histórico, político e econômico de cada país. Pelo visto o autor ao invés de referenciar-se em Educação Comparada, referencia-se em Educação Comprada!



[1] Graduada em Pedagogia pela UFPR – Universidade Federal do Paraná. Pós graduanda em Arte e ensino de Arte, pela FAP – Faculdade de Artes do Paraná. Professora da rede municipal de ensino de Curitiba.

[2] O Ideb foi criado pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) em 2007, como parte do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Ele é calculado com base na taxa de rendimento escolar (aprovação e evasão) e no desempenho dos alunos no SAEB (Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica) e na Prova Brasil.

[3] O PISA (Programme for International Student Assessment) é um programa internacional de avaliação educacional organizado pela OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico). Propõe-se a fazer uma avaliação do desempenho dos estudantes de 15 anos de idade para obter indicadores relativos aos sistemas educacionais dos países participantes. O Brasil participa, de forma voluntária, através do INEP.